quarta-feira, 2 de setembro de 2015

O ESTUPRO MARITAL NA ATUALIDADE É POSSÍVEL?

O sexo é a mola propulsora do casamento. Depois do amor, é o segundo elemento que dá sustância ao relacionamento conjugal, pois sem ele, o casamento não subsiste.

Tenho que o sexo é o tempero do casamento. Quando o casal está mal na cama todo o entorno vai mal também. Sem ele, o relacionamento acaba e no máximo pode subsistir uma "amizade".

Ninguém casa para ser só amigo do outro. Casa-se para amar e ter relação sexual, enfim, dar e sentir prazer, além de procriar. Isso faz parte da natureza humana, não há como negar.

Mas, o tempo é o verdadeiro inimigo da relação conjugal e se o casal não vigiar, o matrimônio tende ao fracasso. Com o tempo o número de relação sexual no casamento diminui e isso tem sido um dos principais problemas, principalmente para o homem.

Necessitado de sexo, o homem não se contenta com essa diminuição na relação e por conta disso, pode agir como um ser irracional em prol de seu desejo natural.

Pegar a esposa na marra seria a solução para satisfazer esse impulso sexual e tal atitude constituiria em um ato lícito ou ilícito? Se assim agir estaria o marido cometendo estupro contra a sua esposa ou simplesmente estaria amparado pelo exercício regular do direito, já que o sexo é requisito indispensável no contrato conjugal, de acordo com o Direito Civil? (art. 1.566. Inciso II e III).  É possível haver o crime de estupro na relação conjugal entre marido e mulher?

 Pensando nisso, resolvi fazer este breve estudo, haja vista ser muito pertinente, para trazer ao amigo leitor um esclarecimento sobre o caso.

Pois bem. A discussão sobre a possibilidade da ocorrência do crime do estupro entre pessoas casadas teve origem há muitos anos e ainda hoje se debate. Muitos doutrinadores rejeitam essa possibilidade, a exemplo de Nelson Hungria e Magalhães de Noronha, enquanto que outros, a exemplo de Damásio e Mirabete, bem como este autor, asseguram que é possível sim.

O Código Penal brasileiro utiliza-se de normas objetivas, visando à proteção de certos bens jurídicos, independentemente da pessoa e de seu titular. O objeto tutelado pelo ordenamento jurídico no crime de estupro é justamente a liberdade sexual das pessoas, ou seja, procura-se defender as escolhas e disposições, no aspecto sexual, que o indivíduo faz do próprio corpo.

O Artigo 213 do Código Penal traz o seguinte enunciado:

"Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos”.

Observe que de acordo com o dispositivo legal acima referido, só há estupro quando o agente constranger (obrigar ou coagir) alguém à prática da conjunção carnal, mediante emprego de violência ou grave ameaça, ou seja, o delito só poderá ser configurado quando a vítima não quiser praticar a conjunção carnal com o agente, não importa se é casado ou não.

O Direito Penal é muito objetivo e o ordenamento jurídico defende a liberdade sexual da pessoa, de forma que o indivíduo possa escolher quando, como e com quem quer praticar sexo. Não há qualquer menção no Código Penal sobre escusas no crime de estupro quando este for casado com a vítima.

Não é mais aceitável aquela ideia antiga de que não é possível que o marido cometa estupro contra a própria esposa porque este detém sobre ela o direito de exigir a prática da conjunção carnal com ele, baseado nas obrigações matrimoniais asseguradas no Direito Civil (art. 1.566. Inciso II e III). Lógico que isso não existe mais no mundo moderno. A cônjuge não é obrigada a transar com o marido na hora que ele bem quer. Tem que haver consentimento desta.

Se a esposa ou o marido está faltado com as obrigações sexuais; se o relacionamento está frio, falido ou prestes ao fracasso, partam para o divórcio.

Pois é. A recusa da esposa em praticar o sexo não dá o direito de o marido lhe estuprar, mas sim, de exigir, se for o caso, o término da sociedade conjugal na esfera civil, por infração a um dos deveres do casamento. Isso é fato. Pegá-la apulso jamais, porque tal atitude é incompatível com a dignidade da mulher.

Se o marido quiser praticar o ato sexual com sua esposa e esta não lhe permitir e mesmo assim ele resolve pegá-la a força, estará cometendo sim o crime de estupro, configurando-se, neste caso, a elementar do tipo penal descrita no Artigo 213 do Código Penal e terá, inclusive, a pena aumentada da metade, nos termos do Inciso II, do Artigo 226 do mesmo diploma legal.

É verdade, o estupro cometido no relacionamento conjugal deve ter uma das causas de aumento de pena, podendo o agente ativo ser condenado a uma reprimenda de 15 anos de reclusão (em caso de estupro simples).

Note que o dispositivo legal é objetivo com relação a esse tipo de conduta, não restando dúvida alguma acerca do tema.

Diante do exposto, conclui-se que é possível sim a ocorrência do estupro marital, porque com o advento da Constituição da República de 1988, as mulheres tiveram seus direitos equiparados aos dos homens e protegidos pelo ordenamento jurídico brasileiro.

A existência de relacionamento amoroso entre vítima e agressor não tem o condão de excluir a ilicitude do fato, uma vez que, embora a relação sexual seja lícita ao cônjuge, o constrangimento ilegal para realizar a conjunção carnal à força não constitui exercício regular de direito, sendo a relação sexual mantida à força pelo marido contra a esposa ato incompatível com a dignidade da mulher.

Se um crime contra os costumes viola a liberdade sexual da pessoa, ele viola os direitos de homens e de mulheres indistintamente, não importando a relação de parentesco ou de amizade que a vítima tenha com o sujeito ativo.

Com a reforma do Código Penal ocorrida em 2005, através da Lei 11.106, o crime de estupro cometido no casamento passou a ter a pena aumentada de até a metade, o que se mostra cabalmente relevante e proporcional no mundo moderno.

Quando o ato sexual espontâneo não ocorre mais no casamento é porque este já faliu há muito tempo e isso não dá o direito de o outro pegá-la na marra. Se isto ocorrer, caracterizada estará a ocorrência do crime de estupro, descrito na elementar do tipo penal do art. 213 do Código Penal.

É o que tem a dizer,


Eudes Borges

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